Aos poucos o país e os portugueses vão-se libertando do manto pestilento que caiu sobre terras lusas nos últimos meses. E esta pestilência em nada respeita à alternância política quer o Portugal conheceu no passado dia 6 de Junho. Quem saiu, quem entrou, forma e são portugueses e, pese embora a avaliação política que se faça de quem nos governou nestes últimos seis anos, ninguém porá em causa o seu sentido de Estado ou defesa intransigente dos valores e da soberania nacional.
A peste a que me refiro veio, aliás como sempre, do exterior. Ventos fétidos daqueles que quiseram precisamente interferir nessa soberania, não por força ou imposição da sua capacidade de auxiliar, mas sim pela determinação que colocaram em tornar esse auxílio numa forma de subjugação. Aí, Sócrates falhou e este será porventura o maior desfio que Passos Coelho terá de enfrentar.
A Alemanha, com a senhora Merkel à cabeça, foi a mandatária daquilo que seria uma forma ensaiada de “colonialismo de modelos sistémicos de governação” carimbados em Berlim e destinados a salvar toda uma estratégia de política federalista ensaiada no seio de uma União Europeia que cada vez se afasta mais desse mesmo conceito de união e se vê remetida para as formas primárias da sua génese, de aliança económica, essa sim com provas dadas. E à cabeça do movimento surge um estranho personagem chamado Durão Barroso, cada vez carregando mais o semblante de carrasco do seu próprio país.
Esta pestilência, aparentemente desgovernada, mas que foi cirurgicamente orquestrada e governada do ponto de vista comunicacional, deixou-nos à beira da catástrofe pela exacerbação de vulnerabilidade com que se tentou mascarar Portugal, deixando o país à mercê dos predadores, muitos deles sentados no imaculado sistema financeiro alemão.
Como escreveu Camus no seu romance A Peste, “…ao ouvir os gritos de alegria que subiam da cidade, Rieux lembrava-se que esta alegria estava sempre ameaçada. Porque ele sabia o que esta multidão eufórica ignorava e se pode ler nos livros: o bacilo da peste não morre nem desaparece nunca, pode ficar dezenas de anos adormecido nos móveis, na roupa, espera pacientemente nos quartos, nas caves, nas malas, nos lenços e na papelada. E sabia também que viria talvez o dia em que, para desgraça e ensinamento dos homens, a peste acordaria os seus ratos e os mandaria morrer numa cidade feliz”.
Este será talvez o grande ensinamento a retirar para o futuro.
PS: A fechar, a eurodeputada Ana Gomes marcou mais um episódio triste da jovem democracia portuguesa, aliás como já o tinha tentado com o Presidente da República, Cavaco Silva. É a personificação de uma geração política que já não faz falta ao País.
Crônicas da Frontline