19 de outubro de 2011

Começam os disparates


Característica transversal que todas as crises nos trazem é o chorrilho de disparates com que somos diariamente confrontados.Esta grave crise financeira já revelou que não será excepção, antes pelo contrário será mesmo pródiga nesta matéria.

Atenda-se às palavras de João Salgueiro no Congresso dos Economistas, em Lisboa - personagem aliás a quem este comportamento não tem sido estranho nos últimos anos - reproduzidas no Diário Económico:

João Salgueiro aconselhou os portugueses a "poupar mais", referindo que é possível com os salários actuais, porque os chineses também o fazem.

E não reproduzo aqui uma afirmação descontextualizada. Leiam o resto. João Salgueiro é mais um dos contornos salientes da grave crise geracional que atravessamos, perante uma geração (a sua) que teima em se agarrar ao Poder e que neste últimos longos anos nenhum benefício lhes é conhecido em prol da Democracia. Aliás, a propósito deste personagem que o diga Pedro Santana Lopes.

14 de outubro de 2011

"Estupidamente" esclarecidos - Episódio II

Basta reter algumas declarações de hoje de responsáveis europeus (embora por prudência, como seria de prever, ainda só falam porta-vozes) para se perceber o alcance do que escrevi no post anterior.

Diz  Amadeu Altafaj, o porta-voz da Comissão Europeia: «É verdade que este é um exercício muito desafiante e que factos recentes colocam ainda mais pressão em termos de concretização dos objectivos de equilíbrio, mas não temos qualquer dúvida sobre a determinação do Governo em fazer o que for preciso».

É um desafio desafiante porque os responsáveis europeus não fazem a miníma ideia do que resulta ou resultará da aplicação do "modelo de resgate com formatação UE", suas consequências económicas e sociais.

A única permissa razoavelmente previsível é o de acautelar o retorno e respectivo juro do capital de resgate. E o conforto fica todo na determinação que reconhecem ao governo. É apenas dessa determinação que precisam para a sua salvação. Pergunto, no entanto, se este porta-voz não terá falado à revelia de Durão Barroso e se o seu HMV não será lá mais para os lados da ex-RDA agora chancelada.

Um governo "estupidamente" esclarecido


A face menos conhecida do Primeiro-ministro Passos Coelho é a sua capacidade de doutrinação política, se é que a expressão existe e que ontem revelou o seu lado pujante. A nova doutrina de acção da sua equipa é a da governação "estupidamente" esclarecida. O problema é que não é mal intencionada, é convicta e assumida como o caminho correcto para salvar Portugal. Passos Coelho é uma pessoa idónea e séria, já o provou, mas está rodeado de imbecis no que respeita a matéria económica. Qualquer estudante de economia percebe que este caminho é o limiar do suicídio para a recuperação económica. Porque se  sente então o Primeiro-ministro como um homem no trilho certo?  Primeiro porque tem um Ministro das Finanças com "Formatação UE". Depois porque tem uma equipa económica fraca e desenquadrada da realidade. Terceiro, porque as instâncias internacionais validam o caminho que Passos segue e que é o único que o FMI e o BCE conhecem. E daqui resulta uma acção política supostamente esclarecida mas que acaba por redundar numa vertente "estupidamente" esclarecida.

Esta semana Cavaco Silva ensaiou um discurso duro contra o status quo europeu e deixou um claro aviso de que as metas só seriam atingíveis em condições de acelerada desagregação económica e social. Durão Barroso, nas suas últimas intervenções, parece ter percebido (perante uma Comissão Europeia que começa a ser relegada para segundo plano pelo nefasto eixo Paris-Bona) que este não é o caminho e curiosamente aproxima o seu pensamento de muitas das ideias defendidas pela esquerda europeia e não pelos seus apoiantes directos, nomeadamente o PPE.

Está na cara de qualquer pessoa (apenas) esclarecida que a prioridade deste governo teria de ser renegociar, em primeiro plano, o prazo de aplicação do programa da Troika, tanto mais que a capacidade e a manifesta vontade de Portugal atingir e cumprir as suas metas já ficou plenamente demonstrada nestes primeiros 120 dias de governação PSD.

Mas, na verdade, o Governo optou por se vexar aos superiores interesses de "uma Europa" pouco esclarecida no caminho que quer seguir ou então "estupidamente" esclarecida sobre o caminho que alguns querem que seja seguido.
Passos abriu caminho para uma profunda fractura no tecido social em Portugal.

Precisamos de um Primeiro-ministro esclarecido e não de um governante "estupidamente" esclarecido, apesar da seriedade, empenho e determinação que os portugueses lhe reconhecem.
Passos ainda está a tempo... de Mudar!

19 de setembro de 2011

A escassos dois minutos... de nada


O episódio é singelo mas, ao mesmo tempo, trágico no retrato fiel do quotidiano de um país à beira do nada. Um indivíduo entre no tribunal de Almada para pedir o certificado do registo criminal. O segurança, tranquilo, diz-lhe, apesar da porta aberta que só abrem às duas e meia. O indivíduo olha para o relógio e repara que poucos minutos faltavam. Anui, sai, bebe um café e regressa. Entra pela mesma porta, olha para a senhora distraída no balcão onde deveria tratar do seu assunto, mas o mesmo segurança interpela-o novamente e sustenta «só às duas e meia». O indivíduo olha para o relógio e diz «mas são!». O segurança assume então um ar didáctico e aponta para um relógio grande, de ponteiros, colocado numa posição elevada sobre uma parede. «Sabe, nós guiamo-nos por aquele relógio e são duas horas e vinte e oito minutos».

E ali ficaram aquelas três personagens, o indivíduo, o segurança e a funcionária do tribunal, suspensos durante 120 segundos, até os ponteiros alinharem a hora de recomeço do período de trabalho da tarde. Aí, a funcionária, despertando da sua letargia, porque assim o «grande relógio da parede», legitimando o seu horário de funcionalismo público o impunha disse, em tom arrastado e sereno: «faz favor?» E assim corre Portugal, a escasso dois minutos de nada ou de tudo.

As análises sucedem-se, mais profundas ou menos profundas, as soluções ensaiam-se, mais profícuas ou, desde logo, destinadas ao fracasso, os Executivos mudam, os políticos sucedem-se e são precisamente estes últimos o manto diáfano que sempre cobre as terras lusas. Os eternos culpados sucedem-se porque os rostos são passageiros e nenhum se perpetua para responder pelos seus pecados governativos. É fácil, a culpa vai-se empurrando para os que se seguem.

Mas será que alguma vez alguém questionou que o verdadeiro problema poderá não estar aí? Qual tem sido a única constante ao longo destas últimas décadas de desgraça? Só vejo uma: os portugueses, todos nós. Parem de culpar quem tem menos culpa.

Não mudem e continuaremos sempre a escassos dois minutos…de nada.
Crônicas da Frontline

17 de agosto de 2011

As Amibas

Na sua definição mais prosaica, a Amiba é um protozoário do filo rizópodes, cujos elementos têm a possibilidade de emitir projecções corporais denominadas pseudópodes que são precisamente utilizados para a sua deslocação e alimentação. Mas a característica mais interessante destes pseudópodes será talvez o facto de provocarem uma constante alteração da morfologia do corpo deste organismo.

Esta amiba – a mais conhecida é a Proteus – é voraz mas inócua. Conhecemo-la, sabemos onde está, mesmo com esta sua capacidade de alterar a morfologia do seu corpo. Mas há outras amibas, por esta mesma capacidade de alteração morfológica (que neste caso passaremos a denominar de alteração ideológica) tem uma capacidade inata de se adaptarem às mudanças sociais e políticas, de ciclos, de regimes, perpetuando-se na paratização dos sistemas. Estas amibas, como as suas congéneres protozoárias dão-se bem nos ambientes pantanosos, no lodo, nos registos de incerteza, fazendo-se valer dessa extraordinária adaptabilidade morfológico-ideológica.

Mas, contrariamente ao que se pode pensar a sua génese não é parasitária. Elas não invadiram o sistema com uma pura e simples lógica de destruição ou perpetuação do seu ciclo de vida. Elas fazem parte do próprio sistema. Mais do que orgânica, a questão é cultural. Os sistemas perpetuam-se através delas e vice-versa.

É nesta lógica que se pode (e deve) entender a razoabilidade de algumas intenções que Passos Coelho tem expressado publicamente com de exigir uma avaliação de todas as nomeações feitas pelo antigo governo. Não se trata de avaliar para expurgar mas sim para perceber a lógica do sistema, de como ele permite absorver esta extraordinária quantidade de amibas. Até porque o próprio Primeiro-ministro sabe que o seu aparelho também tem, ao longo dos anos, sido responsável pelo alimentar deste incontrolável status infeccioso.

Portugal é hoje uma amiba gigante, Na política, na Administração Pública, Nas Forças Armadas (veja-se, por exemplo, o que se passou com a nomeação do mais recente Chefe de Estado do ramo), na Polícia, na Magistratura, onde quer que se vá.

Passos Coelho parece estar na loca certa. A mudança só pode ser geracional.
Crônicas da Frontline

15 de junho de 2011

A Peste

Aos poucos o país e os portugueses vão-se libertando do manto pestilento que caiu sobre terras lusas nos últimos meses. E esta pestilência em nada respeita à alternância política quer o Portugal conheceu no passado dia 6 de Junho. Quem saiu, quem entrou, forma e são portugueses e, pese embora a avaliação política que se faça de quem nos governou nestes últimos seis anos, ninguém porá em causa o seu sentido de Estado ou defesa intransigente dos valores e da soberania nacional.

A peste a que me refiro veio, aliás como sempre, do exterior. Ventos fétidos daqueles que quiseram precisamente interferir nessa soberania, não por força ou imposição da sua capacidade de auxiliar, mas sim pela determinação que colocaram em tornar esse auxílio numa forma de subjugação. Aí, Sócrates falhou e este será porventura o maior desfio que Passos Coelho terá de enfrentar.

A Alemanha, com a senhora Merkel à cabeça, foi a mandatária daquilo que seria uma forma ensaiada de “colonialismo de modelos sistémicos de governação” carimbados em Berlim e destinados a salvar toda uma estratégia de política federalista ensaiada no seio de uma União Europeia que cada vez se afasta mais desse mesmo conceito de união e se vê remetida para as formas primárias da sua génese, de aliança económica, essa sim com provas dadas. E à cabeça do movimento surge um estranho personagem chamado Durão Barroso, cada vez carregando mais o semblante de carrasco do seu próprio país.

Esta pestilência, aparentemente desgovernada, mas que foi cirurgicamente orquestrada e governada do ponto de vista comunicacional, deixou-nos à beira da catástrofe pela exacerbação de vulnerabilidade com que se tentou mascarar Portugal, deixando o país à mercê dos predadores, muitos deles sentados no imaculado sistema financeiro alemão.

Como escreveu Camus no seu romance A Peste, “…ao ouvir os gritos de alegria que subiam da cidade, Rieux lembrava-se que esta alegria estava sempre ameaçada. Porque ele sabia o que esta multidão eufórica ignorava e se pode ler nos livros: o bacilo da peste não morre nem desaparece nunca, pode ficar dezenas de anos adormecido nos móveis, na roupa, espera pacientemente nos quartos, nas caves, nas malas, nos lenços e na papelada. E sabia também que viria talvez o dia em que, para desgraça e ensinamento dos homens, a peste acordaria os seus ratos e os mandaria morrer numa cidade feliz”.

Este será talvez o grande ensinamento a retirar para o futuro.

PS: A fechar, a eurodeputada Ana Gomes marcou mais um episódio triste da jovem democracia portuguesa, aliás como já o tinha tentado com o Presidente da República, Cavaco Silva. É a personificação de uma geração política que já não faz falta ao País.
Crônicas da Frontline

5 de maio de 2011

Os cabeças de Coco

Será que o Partido Socialista (ou o PM) ainda não percebeu que a lógica destrutiva protagonizada por Silva Pereira, José Lello (o do foleiro) Francisco Assis (que tem vindo a revelar uma dupla personalidade conforme o contexto da intervenção ou de debate, não se percebendo ainda quando prevalece a doutrina ou o frete) e Vitalino Canas, entre outros, já foi desconstruída  pela generalidade dos portugueses, percebendo estes agora claramente os seus propósitos?

PS: E a juntar aos "cabeças de coco" (lembram-se do barulho oco que fazem quando batem uns nos outros)  ainda aparece agora uma personagem irreal que dá pelo nome de Basílio Horta?

27 de abril de 2011

Incontornável mediatismo

Santana Lopes e Carrilho, cá um a seu jeito puseram o dedo na ferida. Atenda-se ao que PSL diz hoje no Económico quando compara Sócrates a Tony Carreira (http://economico.sapo.pt/noticias/este-primeiroministro-e-como-o-tony-carreira_116798.html) e ao que refere Carrilho quando classifica a entrevista do Primeiro-ministro à TVI24 de "pura propaganda política" (http://economico.sapo.pt/noticias/socrates-esta-na-pura-propaganda-politica_116800.html).

Mas Carrilho vai mais longe e mais fundo quando afirma que "a situação só demonstra neste momento que "a eficácia da campanha de comunicação do PS de Sócrates só tem equivalente na ineficácia e na desorientação do PSD" que "cai também em todas as armadilhas".

Isto é o que o PSD (incompreensivelmente) ainda não percebeu. Ineficácia e desorientação numa total ausência estratégica no plano da Comunicação. O PSD continua refém de uma actuação táctica (e nós sabemos porquê).  Passos Coelho está esquecido que em Política a comunicação obedece a três regras simples: Estratégia (que sustente a actuação a nível táctico) Iniciativa (que roube o espaço de intervenção) e uma clara definição dos targets de comunicação (que permita adequar conteúdos, formatar referenciais,  adequar contextos e estar apto a enfrentar todas as circunstâncias). É básico. E um último conselho: falar para quem importa, os eleitores, o povo, os portugueses.

Para inglês ver... lamentável

Quando o País precisa de mobilizar a sociedade civil e alguns portugueses começam finalmente a perceber que, para além da Educação e da extinção das elites, este é um dos nossos mais graves problemas estruturais, aparecem umas criaturas sedentes de um novo protagonismo com iniciativas como apresentar uma queixa-crime contra o Primeiro-ministro porque deu tolerância na quinta-feira à tarde anterior à Páscoa. Veja-se a notícia do Público: http://www.publico.pt/Política/advogado-apresentou-denuncia-no-mp-contra-socrates-por-causa-da-tolerancia-de-ponto_1491550

Há que separar claramente os planos de actuação e não andar aqui a ensaiar números mediáticos que nada mais revelam do que a mediocridade de pensamento mascarada com "uma grande dimensão de responsabilidade ética" com que estão questões são encaradas.

22 de março de 2011

Bruxelas recua e deixa PEC em aberto

Ao contrário do que se possa pensar parece haver algumas cabeças esclarecidas em Bruxelas. Este recuo não é  para dar folga a Sócrates. É sim abrir a porta para a entrada de um novo Governo em Portugal, com legitimidade política e social.
Este precedente abre também um horizonte de preocupação para a Alemanha que, cada vez mais, vai ver a sua posição contestada, a começar no seio da própria União Europeia.
É interessante constatar que esta declaração é feita por Amadeu Altafaj, o porta voz do comissário Olli Rehn, que ontem tinha concordado com o presidente do Eurogrupo, Jean Claude Juncker, ao "não ver qualquer razão que pudesse fazer com que mudássemos o programa" português, conforme vem reproduzido na imprensa, nomeadamente no Económico.