11 de julho de 2008

Beba um whisky com o ginecologista




Já viu a seta branca no logo da FEDEX? Ver para além do óbvio e do que nos é induzido é uma vantagem competitiva, particularmente em gestão de comunicação de crises. É o factor PAT que traduz três domínios fundamentais de actuação: Argumento, Psicológico e Trunfo.

Num mundo moderno, cada vez mais volátil, em que a informação gira à velocidade da luz, neste caos organizado qual é a probabilidade da sua empresa ser atingida por uma situação de ruptura, de crise? Como gerir quando o impossível acontece?
A resposta não é óbvia, pese embora hoje existir um corpo de saber e doutrina muito bem estruturado em matéria de gestão de crises. Mas este é também o paradigma do óbvio e da resposta estruturada: nem sempre as melhores soluções respondem aos mais simples problemas. Porquê? Porque a crise é uma realidade inerente à própria ordem, como tal assumindo uma natureza latente que pode ser despoletada a qualquer momento. Mas uma crise só faz sentido se for entendida como tal. E é uma percepção construída nos dois sentidos, ou seja, para dentro e para fora da organização. E neste sentido, existe um elemento central que é factor crítico, o denominado referencial, que congrega os Públicos, a formulação dos argumentos e a expressão das suas opiniões.
Crítico quando assim não entendido, porque cada organização move-se num quadro referencial específico, por mais lato que seja, mas este quadro é dinâmico e muda as suas características a todo o momento, mudando os seus actores e as suas percepções. Não só varia de organização para organização como dentro da própria organização.
O exemplo do ginecologista é elucidativo: Após um dia de consultas e esperando por uma paciente, já regular e que se atrasara, o médico senta-se tranquilamente e opta por beber um whisky. A recepcionista já saíra e quando a paciente chega, acaba ela também por se sentar num momento de conversa e descontração com o seu médico antes de se iniciar a consulta. É neste momento em que batem à porta e o clínico ao levantar-se exclama: “oh, é a minha mulher… depressa, dispa-se e abra as pernas”.
Óbvio!
Para onde nos conduz então este exemplo? Talvez para todo um conjunto de novas abordagens e para a construção de vantagens competitivas, não só na prevenção como na gestão de crises no seio organizacional. A vantangem de quem vê a seta branca no logo da FEDEX é precisamente essa:
É um Trunfo porque diferentes percepções (atenda-se ao referencial) podem-nos fazer antecipar porblemas, mas também soluções;
É Argumental, porque nos vai permitir construir respostas por antecipação, mas também reagir, quando necessário, com consistência de argumentos aos diferentes públicos envolvidos na nossa organização;
É Psicológico porque, ao assumirmos que temos uma vantagem competitiva, aumentamos o nosso patamar de segurança, diminuindo o factor risco da nossa actuação, por via da regra em situações de grande pressão.

Probabilidade versus factor risco.
Pergunte-se ao comum dos mortais quem corre maior risco de partir uma perna, se um pará-quedista nas sucessivas aterragens ou uma pessoa vulgar a caminhar no dia à dia. A resposta (mais uma vez) é óbvia e aponta para o pará-quedista. Só que também aqui o óbvio esconde uma realidade completamente diferente. É que a probabilidade de isso acontecer ao pará-quedista é infíma quando comparada com a pessoa que caminha no seu dia-a-dia. Porquê, precisamente pelo facto de que uma aterragem ao ter um elevado factor risco, leva a que o pará-quedista actue com uma atenção redobrada, in sitio, para a sua concretização, fruto também da sua prévia preparação. Quem caminha na rua, pelo contrário, caminha naturalmente e sem prestar atenção ao terreno que pisa.
A conclusão é obvia. Regra comum, o tecido organizacional indexa o factor risco com perigosidade, descuida o critério probabilidade e, quando o impossível acontece e a crise rebenta, a primeira reacção é de espanto, “como pôde isto acontecer”. Parte logo numa posição de desvantagem.
Quem vê a seta actua sempre como se a sua organização fosse uma pará-quedista e antecipa, mesmo que o caminho já tenha sido repisado vezes sem conta.

A esfera interna ou a realidade esquecida
A crise é uma agressão exterior ao tecido organizacional? Da pergunta rapidamente passamos à conclusão de que este é outro dos mitos que a generalidade dos gestores entende como verdade inabalável. Mas será mesmo assim? Na realidade, muitas das crises rebentam por implosão, por manifesta negligência da esfera interna das organizações. E a generalidade destas são as que atingem pessoas, executivos de topo, e que provocam efeitos avassaladores, quer no plano individual, quer nas organizações.
Dois exemplos recentes, embora de diferente repercusão são ilustrativos: o caso Jardim Gonçalves / Banco Comercial Português e o de Eliot Spitzer, o mayor de Nova Iorque apanhado no envolvimento com uma prostituta de luxo. Em ambos os casos a ameaça foi residente, gerada na própria esfera de actuação dos indivíduos. Nas organizações, o enlace pode ser o mesmo, quando a cultura organizacional é fraca, quando falha a comunicação interna, quando a organização é entendida pela gestão de topo como um “mero aparelho reprodutivo sem vida própria”.

Lázaro ou a crise ressuscitada
“Crisis Management deals with the reality of the crisis. Crisis Communications deals with the perception of the reality”.
Este é o último statement nas vantagens competitivas. Em crise, a gestão fundamental terá sempre de actuar ao nível das percepções. Porque quando a crise ganha vida própria, o combate passa para a esfera da Imagem que vai ser construída, das percepções que vão ser induzidas e da importância que lhes vai ser atribuída.
E esta vida é outra das questões chave. É que uma crise efectivamente “nunca morre”. É o sindrome de Lázaro nas organizações - Uma crise pode sempre ressuscitar ou ser ressuscitada a qualquer momento.
Se um dia for um executivo de topo e alguém lhe disser que viu a sua mulher a beber um whisky com um ginecologista, a sua recção pode causar perplexiudade no seu interlocutor, mas significará, sem dúvida, que a sua empresa está preparada para responder a qualquer crise, mesmo quando o impossível acontece…
Crônicas da Frontline

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