10 de abril de 2008

Life’s Short. Get a Divorce


Poderosas máquinas de marketing e comunicação estão hoje nos bastidores da advocacia norte-americana e regem um universo de milhões e milhões de dólares com uma maturidade invejável. Não é uma visão mercantilista da Justiça, mas sim as exigências de um mercado altamente competitivo. Se a Europa tende a acompanhar as tendências, em Portugal o fosso é ainda abissal.

Quando em Maio de 2007, a sociedade de Advogados Fetman, Garland & Associates lançou a campanha publicitária “Life’s Short. Get a Divorce” – apoiada em outdoors que mostravam duas imagens de um homem e de uma mulher com grande carga sexual – a polémica atingiu os mais altos níveis da sociedade americana. As pressões políticas levaram mesmo à retirada da campanha das ruas de Chicago. Mas hoje, mesmo os mais críticos reconhecem a mestria de Corri Fetman, a advogada especialista em Direito da Família, que ousou ir mais longe e conseguiu uma cobertura mediática e um nível de notoriedade que calou tudo e todos. A tal ponto que Corri tem inclusivamente uma coluna jurídica na Revista Playboy.
Mas o que a campanha da Fetman, Garland & Associates acabou por revelar foi o elevado grau de maturidade do mercado dos serviços legais nos Estados Unidos. De facto, se existe traço claramente distintivo que caracteriza o panorama jurídico norte-americano, mesmo num mundo cada vez mais global que quer até caminhar para um Direito Universal, esse traço é a poderosa máquina de marketing que está por detrás das sociedades de advogados. O denominado Legal Marketing não é só um negócio de milhões, é todo um corpo conceptual de saber que hoje rege os negócios da advocacia em mercados altamente competitivos. O mundo da advocacia transporta-se assim para os meandros das lógicas de mercado, gerindo reputação, trabalhando Branding, Posicionamento, usando as Relações Públicas e a Publicidade como elementos fundamentais à sustentabilidade do negócio no qual assenta o exercício da sua profissão.
Não é uma visão mercantilista da advocacia, é sim a realidade imposta por um mercado que hoje é altamente sofisticado e competitivo. E se os americanos cedo perceberam a lição, a Europa rapidamente lhes tentou apanhar o passo. O Reino Unido não é excepção e mesmo a nossa vizinha Espanha já conheceu avanços significativos nesta matéria. No entanto, não deixa de ser curioso olhar para o fosso que ainda separa estas duas realidades. Enquanto os advogados do velho continente ainda estão reféns dos fundamentais do marketing, os americanos escalaram já um nível no debate de ideias, ou seja, actualmente uma das preocupações críticas das suas grandes sociedades de advogados é, por exemplo, como inter-relacionar o marketing da firma com o marketing individual do próprio advogado.
“Market the Firm or Market the Attorneys? Acaba por nos conduzir um debate centrado numa entre muitas outras questões críticas que estão a confrontar o mundo da advocacia com novos paradigmas face a uma cada vez maior necessidade de desenvolvimento sustentado do negócio no mercado dos serviços jurídicos. É o caso do confronto com disciplinas como a Gestão da Informação quando, na realidade, existe já uma clara percepção de que o Marketing, per si, não chega para estabelecer uma diferenciação verdadeiramente competitiva e alavancar novos negócios. Parece-nos óbvio que o caminho passa pelo cruzamento de toda a informação dentro das sociedades de advogados, a financeira, a comercial, a de marketing… Mas isso obriga também a um profunda mudança, não só funcional, mas sobretudo cultural no universo da advocacia. O mercado anglo-saxónico já respondeu a esta mudança e hoje, nas grandes firmas, é comum encontrarmos o CEO (Chief Executive Officer), o CFO (Chief Financial Officer) e até o CMO (Chief Marketing Officer), libertando os advogados para o que bem sabem fazer no exercício da sua actividade jurídica.
Curioso é também o facto de que acabam por ser estes novos paradigmas – numa contradição assim se esgotar no plano formal – que acabam por expandir as possibilidades desse mesmo Marketing, quer através da introdução das novas tecnologias de informação, quer porque as sociedades de advogados começaram a incorporar novas responsabilidades, como o próprio desenvolvimento do negócio, o planeamento estratégico, o recrutamento, a gestão dos recursos humanos, entre outras, debaixo de velho e grande “guarda-chuva” a que continuamos a chamar Marketing.
Se olharmos para as 100 maiores sociedades de advogados norte-americanas, os números revelam que, nos últimos anos, o negócio da advocacia tem crescido a uma média de 10% ao ano, enquanto os investimentos de marketing a um ritmo bastante superior, na ordem dos 30% ao ano. Aliás, os números sempre foram impressionantes. Basta rever alguns estudos da FGI e da Greenfield/Belser, comparando dados de 1991 a 1999 no universo das 1000 maiores sociedades de advogados norte-americanas, para retermos algumas elucidativas conclusões:
O investimento médio em marketing passou, em oito anos, de 1233 dólares por advogado para 9135 dólares por advogado, um crescimento de 746%;
Em 1991, apenas 56% das sociedades tinham alguém responsável pela área do marketing. Em 1999, 93% das sociedades tinham equipas de marketing;
Apesar de nos Estados Unidos a publicidade no universo jurídico só ter sido permitida a partir de 1978, em 1991 apenas um terço das sociedades existentes colocava alguns anúncios (basicamente rodapés) em publicações especializadas. Em 1999, 85% das sociedades recorriam à publicidade de uma forma regular.
Se acreditarmos nas lógicas de mercado, nos benefícios da concorrência, com a salvaguarda dos necessários mecanismos de regulação, então a Justiça americana permite que se afirmem os melhores entre os melhores. A Europa, também ela, nesta lógica de oferta e procura de serviços jurídicos, caminha neste sentido. Para Portugal, o fosso é ainda muito profundo. Talvez porque o peso de influência dos advogados seja ainda o principal factor de inibição de um mercado verdadeiramente competitivo nos serviços legais. Logo, o marketing continua incipiente. Tudo acaba por se resumir a uma aposta nas relações com a Comunicação Social, projectando não os serviços ou as sociedades mas os apenas os protagonistas. Sejam advogados, advogados deputados, ou advogados outra coisa qualquer. Poucas são as sociedades que têm uma verdadeira visão empresarial neste domínio. E essas, regra geral, são as de expressão internacional.

Crônicas da Frontline

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