10 de abril de 2008

Are you talking to me?

Hoje, a fórmula política mais recorrente para se falar de Portugal é, sensu lato, o atraso estrutural do país. Ninguém escapa ileso à “bolha comunicacional” que, a este nível, contamina o nosso quotidiano. E apesar da carga política, os protagonistas são oriundos de todos os quadrantes da sociedade, de todos os credos, de todo o espectro social e cultural. Mas é nesta estranha (ou talvez não) dinâmica que reside a sua face mais obscura, de ela própria no seu devir esconder uma realidade bem mais preocupante: a do atraso estrutural ser efectivamente, na sua génese, nada mais que um profundo abismo cultural que se apoderou deste canto lusitano.
Vem isto a propósito desta bolha comunicacional, desta ânsia que se instalou em todos nós de comunicar, independente do que se comunica ou mesmo da pertinente necessidade de o fazer. E esta voracidade, como o napalm, queima tudo, mas veio sobretudo criar um conjunto de novos mas perigosos paradigmas que invertem toda a lógica da Galáxia de Guttenberg.
Are you talking to me? Será talvez a única pergunta racional numa sociedade desagregada e desestruturada do ponto de vista comunicacional, quer nos seus actores, quer nos seus valores, e compelida apenas por uma lógica mecanicista de atingir alvos e públicos a qualquer custo, em qualquer lugar.
Razões são muitas, mas uma enferma logo na base. Se olharmos para Portugal percebemos que, no seu movimento anacrónico no tempo, só há muitos poucos anos o país despertou para todas as novas envolventes comunicacionais, que já conduziam uma Europa mais desenvolvida para a realidade da sociedade da informação. E este despertar começou naturalmente por atingir as áreas de maior competitividade nos domínios económicos e empresarias, até então excessivamente dominados pela oligarquia do marketing e afins, agora incapazes de dar resposta a novas necessidades do ponto de vista Corporativo, Institucional, da Responsabilidade Social, da própria Gestão da Reputação.
Durante anos fomos assistindo ao cimentar desta nova realidade, sobretudo com os tecidos económicos e empresariais a reequacionarem as suas orgânicas internas e estruturas de Poder, enquanto um número, embora ainda ínfimo, de profissionais de comunicação começava finalmente a ter o seu espaço de actuação.
Mas foi precisamente aqui que o processo falhou. E falhou por duas razões de natureza estrutural: primeiro porque estes profissionais se limitaram e reduziram a um papel de interface, nomeadamente com os Media, e nunca foram envolvidos ao mais alto nível nos ciclos de decisão das estruturas; em segundo, e por esta anterior razão, porque nível mais básico da decisão em comunicação – o que se comunica e não como se comunica – foi deixado ao critério de quem não estava naturalmente preparado para gerir esses domínios.
E de repente o monstro tornou-se voraz, porque tudo é comunicável. Mas não só voraz, ganhou vida própria. Até os actores políticos sucumbiram a esta voracidade. Há muitas décadas atrás, um modelo semelhante teve sucesso a sustentar as mais hediondas ditaduras. Chamava-se Propaganda. Hoje só pode ter sucesso em sociedades estruturalmente (leia-se culturalmente) atrasadas.
A ameaça é real, mas, aos costumes, os protagonistas (gestores, políticos, empresários, consultores, jornalistas…) continuam a dizer nada. Poucas ainda são as vozes a exigir uma verdadeira revolução na Gestão da Comunicação.
Crônicas da Frontline

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